terça-feira, 12 de agosto de 2014



Advogado e Justiça.

Impossível desassociar o advogado, aqui considerados os homens e as inúmeras mulheres, da luta do cidadão contra as incongruências da vida. O eterno porta-voz entre o povo e o Estado, entre o cidadão e seus pares. Em suma, o carregador de problemas com o compromisso de resolvê-los.
No dia a dia, na solidão da vida intelectual, há a procura de argumentos, de palavras, de prejulgados e de clientes. Estes não descem do céu. Alguém diria que advogados são masoquistas, pois caminham na contramão da vida, procurando problemas para resolver e disso tirar seus honorários. Advogados, seres de cabeça baixa, carrancudos, severos, preocupados, parecendo já não sorrirem mais, tendo perdido a sensação de poder viver a vida.
Então, o que moveria tais seres, senão a vontade de ver a Justiça realizada e a paz social bem serem restabelecidas?
Tal idealismo hoje está cada vez mais difícil de ser mantido face o sistema gerado que favorece o materialismo e o individualismo em nosso despreparado país de origem cristã. Já se pode antever que clientes não vão faltar, pois a sociedade norteada por tais princípios gera cada vez mais conflito entre as pessoas, quer seja no campo pessoal, profissional quer seja no comercial. Com a diminuição da sensibilidade e da prática dos princípios cristãos de amor ao Próximo, perdão, renúncia etc, é de se ver que os conflitos já fazem o Judiciário, abarrotado de processos, buscar modos de agilização.
Outro aspecto que dificulta a manutenção do idealismo do advogado são as tendências atuais numa sociedade ainda marcada pelos traços da mudança do agrário para o urbano. Neste sentido as falsas mensagens dadas direta e indiretamente de que tudo é transitório, de que nada é para sempre, de que a decadência dos objetos materiais também existe para os valores humanos de convivência, de que a vida é curta etc. Tais mensagens criam ações e reações motivadas pela ansiedade, pela impaciência e intolerância e acabam tornando as pessoas atormentadas e instáveis.
O estudante de direito, o advogado, o Juiz, o promotor não estão imunes a tal orquestrada e proposital propaganda, pois quem não quer bons salários, bons carros , boas casas, férias e viagens para fugir do corroído centro urbano? O erro é aceitar que tais desejos sejam instigados com ansiedade, competição e comparações. O erro é pensar que tudo virá como passo de mágica e da noite para o dia, sem esforço, sem o necessário tempo e sem sacrifício do lazer e conveniências pessoais. A sensação de incompetência, de insatisfação, de frustração parecem ser a consequência espelhada na depressão e no vazio do cotidiano. Isto leva a atitudes bem comuns como a do estudante de Direito, que querendo valorizar a prática desdenha a teoria, o advogado e outros que se metem em causas e defesas de esquemas imorais, querendo obter riqueza que o livre de vez do penoso trabalho judicial do dia à dia.
A vida, como ela está sendo transformada no nosso país, não favorece muito o trabalho intelectual, a vida dedicada aos livros, o esforço pessoal para chegar a objetivos de longo prazo e a vida regrada por princípios cristãos da convivência. Surge assim para o advogado o desafio maior que é o de vencer as más tendências da sociedade e persistir numa profissão que exige dialética, argumentação, intelectualidade, horas de estudo e concentração, paciência e persistência, burocracia e muitas horas de procedimentos em pesados processos.
Não esqueçamos que o cliente, já condicionado pela mídia e pressionado pelas tendências impostas, exige rapidez também. Seja ele pessoa jurídica ou física, o seu problema demanda uma solução rápida, pois sua vida não pode ficar parada.
Está visível que o desafio posto é para super pessoas, algo como fazer alguém se confessar em pleno salão de baile. Navegar contra o vento. Somente com estudo, inteligência, persistência, força moral, poderão os novos e antigos advogados vencer este desafio.
E ainda temos, apesar de todas as dificuldades, o Poder Judiciário já dando sinais de fracasso total. Hoje está se tornando uma estrutura cara para o contribuinte e ineficiente para atender a sociedade. Passa a ser questionado e ridicularizado. Com o aumento de conflitos, ainda temos o sistema arcaico de um Juiz por Vara. Pretende-se buscar a agilização através da informática, mas isto só sobrecarrega cada Vara e seu escravizado Juiz e encarece o exercício da advocacia exigindo um caro aparelhamento dos escritórios de advocacia; através de arbitragem, a qual tem se revelado insuficente para muitas causas; através de soluções de Direito Processual, o qual está cansado com o cipoal que criou ao longo dos anos.
Assim, quando chega o 11 de Agosto de cada ano, vemos cada vez menos júbilo e motivo para satisfação, isto porque a classe dos advogados está gasta, está cansada e cada vez mais preocupada.
Resta apostar no talento, na vitória de cada um em vencer os desafios da vida como ela está se transformando e num tremendo esforço pessoal para prosseguir no estudar e buscar cada vez mais esclarecimento para vencer.
Desistir jamais. Tenhamos como exemplo o fato que durante a Ditadura Militar de 1964 a 1981, quando muitos dos direitos constitucionais foram suspensos, os advogados não desistiram. Continuaram batendo na rocha até que ela esbugalhou-se. Hoje não há um regime militar, há algo muito pior e cabe a cada advogado estar alerta, buscar ar novo de cada manhã e esperança dentro de si mesmo para continuar exercendo esta nobre profissão, que muitos a querem apagada e inoperante.
Salários e honorários incompatíveis com a responsabilidade assumida, faculdades sem condições de funcionamento, produzindo bacharéis enganados, um Judiciário de estrutura arcaica, forças sociais de tendências bastante fortes, atuando sobre os desejos individuais e o comportamento social, são desafios da vida atual, mas isto parece ser nada perante a vontade determinada pelo desejo de ver a Justiça prevalecer como ideal humano.
Nada será pior do que chegar a ver um advogado que tenha deixado de lutar e que passe a viver com sua alma amputada, vendida e corrompida pelo vazio de uma vida vulgar sem ideias, um mero e cego seguidor, descomprometido com seu contínuo aprimoramento, enfim um tarefeiro.
Odilon Reinhardt.

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