Advogado e Justiça.
Impossível
desassociar o advogado, aqui considerados os homens e as inúmeras
mulheres, da luta do cidadão contra as incongruências da vida. O eterno
porta-voz entre o povo e o Estado, entre o cidadão e seus pares. Em
suma, o carregador de problemas com o compromisso de resolvê-los.
No
dia a dia, na solidão da vida intelectual, há a procura de argumentos,
de palavras, de prejulgados e de clientes. Estes não descem do céu.
Alguém diria que advogados são masoquistas, pois caminham na contramão
da vida, procurando problemas para resolver e disso tirar seus
honorários. Advogados, seres de cabeça baixa, carrancudos, severos,
preocupados, parecendo já não sorrirem mais, tendo perdido a sensação de
poder viver a vida.
Então, o que moveria tais seres, senão a vontade de ver a Justiça realizada e a paz social bem serem restabelecidas?
Tal
idealismo hoje está cada vez mais difícil de ser mantido face o sistema
gerado que favorece o materialismo e o individualismo em nosso
despreparado país de origem cristã. Já se pode antever que clientes não
vão faltar, pois a sociedade norteada por tais princípios gera cada vez
mais conflito entre as pessoas, quer seja no campo pessoal, profissional
quer seja no comercial. Com a diminuição da sensibilidade e da prática
dos princípios cristãos de amor ao Próximo, perdão, renúncia etc, é de
se ver que os conflitos já fazem o Judiciário, abarrotado de processos,
buscar modos de agilização.
Outro
aspecto que dificulta a manutenção do idealismo do advogado são as
tendências atuais numa sociedade ainda marcada pelos traços da mudança
do agrário para o urbano. Neste sentido as falsas mensagens dadas direta
e indiretamente de que tudo é transitório, de que nada é para sempre,
de que a decadência dos objetos materiais também existe para os valores
humanos de convivência, de que a vida é curta etc. Tais mensagens criam
ações e reações motivadas pela ansiedade, pela impaciência e
intolerância e acabam tornando as pessoas atormentadas e instáveis.
O
estudante de direito, o advogado, o Juiz, o promotor não estão imunes a
tal orquestrada e proposital propaganda, pois quem não quer bons
salários, bons carros , boas casas, férias e viagens para fugir do
corroído centro urbano? O erro é aceitar que tais desejos sejam
instigados com ansiedade, competição e comparações. O erro é pensar que
tudo virá como passo de mágica e da noite para o dia, sem esforço, sem o
necessário tempo e sem sacrifício do lazer e conveniências pessoais. A
sensação de incompetência, de insatisfação, de frustração parecem ser a
consequência espelhada na depressão e no vazio do cotidiano. Isto leva a
atitudes bem comuns como a do estudante de Direito, que querendo
valorizar a prática desdenha a teoria, o advogado e outros que se metem
em causas e defesas de esquemas imorais, querendo obter riqueza que o
livre de vez do penoso trabalho judicial do dia à dia.
A
vida, como ela está sendo transformada no nosso país, não favorece
muito o trabalho intelectual, a vida dedicada aos livros, o esforço
pessoal para chegar a objetivos de longo prazo e a vida regrada por
princípios cristãos da convivência. Surge assim para o advogado o
desafio maior que é o de vencer as más tendências da sociedade e
persistir numa profissão que exige dialética, argumentação,
intelectualidade, horas de estudo e concentração, paciência e
persistência, burocracia e muitas horas de procedimentos em pesados
processos.
Não
esqueçamos que o cliente, já condicionado pela mídia e pressionado
pelas tendências impostas, exige rapidez também. Seja ele pessoa
jurídica ou física, o seu problema demanda uma solução rápida, pois sua
vida não pode ficar parada.
Está
visível que o desafio posto é para super pessoas, algo como fazer
alguém se confessar em pleno salão de baile. Navegar contra o vento.
Somente com estudo, inteligência, persistência, força moral, poderão os
novos e antigos advogados vencer este desafio.
E
ainda temos, apesar de todas as dificuldades, o Poder Judiciário já
dando sinais de fracasso total. Hoje está se tornando uma estrutura cara
para o contribuinte e ineficiente para atender a sociedade. Passa a ser
questionado e ridicularizado. Com o aumento de conflitos, ainda temos o
sistema arcaico de um Juiz por Vara. Pretende-se buscar a agilização
através da informática, mas isto só sobrecarrega cada Vara e seu
escravizado Juiz e encarece o exercício da advocacia exigindo um caro
aparelhamento dos escritórios de advocacia; através de arbitragem, a
qual tem se revelado insuficente para muitas causas; através de soluções
de Direito Processual, o qual está cansado com o cipoal que criou ao
longo dos anos.
Assim,
quando chega o 11 de Agosto de cada ano, vemos cada vez menos júbilo e
motivo para satisfação, isto porque a classe dos advogados está gasta,
está cansada e cada vez mais preocupada.
Resta
apostar no talento, na vitória de cada um em vencer os desafios da vida
como ela está se transformando e num tremendo esforço pessoal para
prosseguir no estudar e buscar cada vez mais esclarecimento para vencer.
Desistir
jamais. Tenhamos como exemplo o fato que durante a Ditadura Militar de
1964 a 1981, quando muitos dos direitos constitucionais foram suspensos,
os advogados não desistiram. Continuaram batendo na rocha até que ela
esbugalhou-se. Hoje não há um regime militar, há algo muito pior e cabe a
cada advogado estar alerta, buscar ar novo de cada manhã e esperança
dentro de si mesmo para continuar exercendo esta nobre profissão, que
muitos a querem apagada e inoperante.
Salários
e honorários incompatíveis com a responsabilidade assumida, faculdades
sem condições de funcionamento, produzindo bacharéis enganados, um
Judiciário de estrutura arcaica, forças sociais de tendências bastante
fortes, atuando sobre os desejos individuais e o comportamento social,
são desafios da vida atual, mas isto parece ser nada perante a vontade
determinada pelo desejo de ver a Justiça prevalecer como ideal humano.
Nada
será pior do que chegar a ver um advogado que tenha deixado de lutar e
que passe a viver com sua alma amputada, vendida e corrompida pelo vazio
de uma vida vulgar sem ideias, um mero e cego seguidor, descomprometido
com seu contínuo aprimoramento, enfim um tarefeiro.
Odilon Reinhardt.
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