quarta-feira, 30 de julho de 2014



Cantareira. Um aviso.
 
Ano de 2025. O cenário tornou-se deserto. Acabou a água. São Paulo, arremedo de cidade americanizada, chega a seu limite. A companhia fornecedora de água vai a pique. Aviso ignorado. A Natureza chega ao limite. A população se apavora. Correm os políticos. Justificativas. Promessas de recursos.  Obras. Mas não tem mais água.

Em 2014, houve medidas tímidas como racionamento ao início, para não afetar a imagem política. Logo surgiram campanhas de redução de consumo. Restrições. Consumo em dias alternados. Depois não tinha mais água e apesar de toda a tecnologia e informática, não havia quem inventasse água. Faltou visão, planejamento, controle, investimentos. Houve excesso de ganância ? As atitudes foram sempre para garantir a receita crescente para garantir os acionistas? Sabe-se lá. Não havia  mais água.

Apesar de a falta de água ser um conhecido caos para todos, o foco neste texto é mais amplo. O caso leva mesmo a outra realidade. O limite da cidade. Esgota-se o espaço, já verticalizado ao extremo. Esgotam-se as alternativas de  mobilidade. O humano não entende, pois tinha tudo por eterno e infinito.

Foi assim que nos idos de 2014, o caso Cantareira foi um gravíssimo aviso para as cidades, todas de portas abertas para todos, concedendo alvarás de construção e ocupação, permitindo tudo que a iniciativa privada e pública desejasse no campo imobiliário. A moda era garantir o “progresso”. Mega prédios, mega loteamentos, sem olhar os verdadeiros recursos e o meio ambiente. Valia o aqui-agora, a política do momento, o progresso, a garantia de expansão do consumo como fonte de impostos, as eleições. Uma corrida tresloucada que logo encontraria limites mais graves.

As cidades, já tornadas em centros de adoecimento da população, verdadeiros centros de psicopatia, preocupavam-se com o material, com a mobilidade urbana, ganhava o candidato que tiver melhores alternativas para o transporte, para o trânsito, para assuntos que ainda podiam ser melhorados, mas chegou o momento em que tudo estará esgotado. Ignoravam o limite do que ilusoriamente tinham por ilimitado.

Exploradas pela ganância de novos negócios e um idiótica modernidade,  as cidades ficavam na mão de interesses de momento, eleitoreiros ou não. O relevante é colocado de lado, em último plano, não rendia votos. Prevalecia a insensatez, o planejamento desconexo e a arquitetura chã e vazia de eufóricos arquitetos sem gosto nem prazer. 

Os sinais de esgotamento aparecem aqui e acolá. O caso Cantareira era grave, mas passou com pouca expressão, eis que misturado a notícias outras do dia a dia. Fazia parte das preocupações para o futuro, mas no momento somava-se ao  caldeirão de notícias, todas fracionadas e diversificadas, colaborando assim falsamente para a amenização dos impactos de certos assuntos graves na população, que inconsciente, seguia sua rotina cega e inconseqüente. 

É assim que a persistirem as tendências atuais e seu persistente agravamento, sem que se observe nenhuma mudança na condução da gestão pública e nos hábitos da população, as cidades terão que fechar suas imaginárias portas e viver entre seus virtuais muros, face o esgotamento de seus limites geográficos e recursos naturais. Ficarão cada vez mais discriminatórias e desiguais, cada vez mais insustentavelmente caras para o ser humano.

Ocorrerá a resultante de imposições não democráticas, do uso da máquina pública para atender interesses privados e públicos  de duvidosas pretensões, da implantação de interesses de balcão e sua manipulação no legislativo, da ausência de decisões para beneficiar o povo em câmaras municipais inoperantes e alienadas, dá má aplicação dos recursos públicos, dos desvios, das maracutaias etc. Teremos, então, enfim, a cidade contra seus cidadãos; um amontoado de prédios dependentes, no limiar da falta de luz e água.

Já temos, hoje em 2014,  exemplos em cidades do interior, onde por vezes só há água transportada de outros lugares. É só o começo. Cantareira é um sinal grave a ser lido.

É mesmo incrível pensar que com tantos rios indo para o mar, vai faltar água em muitas cidades e será muito caro levar água para muitos lugares. O transporte e o tratamento ficarão cada vez mais caros. Mesmo em Curitiba com tantos mananciais, já vimos a estiagem e a ameaça de ficar sem água. Uns milhões a mais na população e estaremos em outra realidade.   

No espaço urbano já estão surgindo limites antes tidos por inexistentes. Políticos só têm a visão umbilical de 4 anos e não enxergam limites para seus interesses de reeleição. O futuro a Deus pertence.

No espaço mundial, há exemplos copiosos da limitação em vários setores. A  China não quer mais gente, estimula a saída de sua população para outros lugares do mundo, cobra imposto sobre crianças nascidas; Israel vai acabar com seus rios e assim por diante. O Japão recicla todos os tipos de materiais. A cidade de Caracas na Venezuela, diante da pane governamental, mandou os cidadãos tomar meio banho e se possível só aos sábados. Curitiba quer mais barragens para garantir o futuro. Adeus Parque Bariguí, pode virar reservatório. 

O uso da água será cada vez mais seletivo, caro. Sua produção exigirá mais custos de operação. O reuso aumentará e será obrigatório dentro das residências e fábricas. O uso da água da chuva aumentará e esta água, poluída,  não servirá só para limpeza, será para beber. Ninguém ousará restringir diretamente o ir e vir como direito constitucional, mas por outros meios haverá restrições de alvarás para construção e ocupação urbana, barreiras tributárias etc. Mudar para a cidade ficará mais difícil e caro; mesmo a  periferia terá seu espaço esgotado.

Talvez a cidade cobrará uma tarifa extra por consumo de água além de uma certa cota por pessoa. Lavar calçadas e carros só com água da chuva. Haverá restrições sérias ao despejo de certas substâncias no esgoto doméstico que possam encarecer o tratamento. A Indústria terá que rever seus produtos químicos utilizados para reduzir o veneno de hoje. Curioso será se surgirem medidas proibitivas e restritivas como a de lavar roupas mais do que duas vezes por semana; haverá para esta regra e outras tantas os fiscais de uso d´água com poder de autuação e aplicação de multa. Aumentará o furto de água. 

O cidadão urbano que se prepare, viver na cidade será caro e restritivo a muitos hábitos de hoje. Hoje a cidade já não resiste a 1 semana de greve  no serviço de coleta de lixo. Após esgotarem os estoques, não resiste a 3 dias sem água, 2 dias sem luz, 2 dias sem produtos da horta, leite e carne. Isto mostra que a cidade depende de uma regularidade, um equilíbrio e já está vivendo no limiar deste. Um fantasma que mora nas suas entradas. 

Pode ser que a Cantareira não seque por completo, mas já serviu para encher o futuro de grandes sinais de aviso e alerta, como os que arriscamos prever para o ano de 2025,no início do texto.

Neste sentido, - Psiu! Garçon! Por favor um copo de água! - Perdoe senhor: água potável só nos sábados e domingos! Tem da chuva de ontem, serve?!

Odilon Reinhardt.