80 anos da OAB no Paraná. É uma história construída por todo advogado que acreditou em sua profissão. Advogados de várias gerações, que enfrentaram o dia a dia da realidade brasileira, com suas particularidades em cada época.
É uma instituição, que no conjunto de seus afiliados, acompanhou linha por linha, petição por petição, a vida privada da sociedade e as crises institucionais. Nada foi fácil durante a evolução democrática, tendo a OAB passado na prática pela aplicação de várias constituições federais, cada uma refletindo a sociedade, seus valores e princípios e as vezes os negando, querendo impor novas e interesseiras modas. Muitas foram as crises políticas e vários os desarranjos da economia, mas tudo foi vencido pelo avanço da luta democrática.
Enquanto em vários períodos o regime era restritivo à manifestação democrática, a população, ocupada com as dificuldades das exigências da vida, nem sempre esteve consciente da lenta retirada de sua liberdade. Advogados lutavam na Justiça para fazer prevalecer o ideal democrático. Nas faculdades de Direito, professores, advogados ou não, insistiam em ensinar princípios e valores retirados momentaneamente dos diplomas legais. Insistiam em ensinar e preservar os ensinamentos básicos, sabendo que nenhum regime fechado resiste ao tempo de acabar e que a juventude acadêmica tinha que ser preservada dos momentos passageiros da exceção. Valeu a experiência, a de persistir, mesmo que falando no silêncio do interlocutor.
Durante 80 anos, houve sucesso para chegarmos até hoje, mas durante o caminho nada fácil, no balcão dos cartórios e varas judiciais, muitas vidas se desenvolveram, no anonimato da vida de cada um. O advogado que ficou rico, o advogado que não pode persistir, o advogado que insistiu mesmo com dificuldades, todos construirão a advocacia paranaense, defendendo em cada causa seus clientes, num trabalho individual que no conjunto engrandece e contribui para a melhoria do ordenamento jurídico nacional.
Neste momento de celebração é de se ressaltar o advogado anônimo, que nunca teve fama; o advogado que foi para a cidade do interior, deixando a capital; o advogado do setor público, obrigado a ver de perto as iniquidades da Administração; o advogado inexperiente, que na vida suplantou as deficiências do seu ensino; o que foi preso na luta contra sua fé e esperança na liberdade democrática; o que lutou nos tribunais militares; todos os demais. A todos eles, deve-se desejar parabéns e dar reconhecimento.
A Nação, assim, foi, é e será construída linha a linha. Não só advogados, mas todos que possuem conhecimento jurídico para sua função no país, merecem celebrar. A OAB sempre foi a referência para onde todos os olhos se voltaram em vários momentos difíceis.
Hoje é outra a realidade do país, todavia, não menos delicada, face o avanço do individualismo e do materialismo, que têm marchado há desandas direta e progressivamente contra a liberdade de agir e de pensar. A legislação ainda oferece resistência e a advocacia ainda é o bastião feito para preservar a liberdade e a democracia. A tendência da uniformização e da robotização do indivíduo tem sido pouco visível e tem usado a camuflagem da invasão de produtos novos sob a alegação de modernidade. Esta realidade, imposta como elemento subliminar, está presente e é ativa na transformação da sociedade pelo lado material, desejando transformar o cidadão em um previsível e manipulável consumidor, com pouco para pensar, escolher, mas muito para comprar, até cegamente.
As consequências de tal estratégia estão pipocando em todos os lugares. Hoje não há regime militar, ditadura em termos explícitos. Não existe causa aparente para a luta, mas existe esta tendência de massificar e progressivamente reduzir a liberdade do indivíduo ao poder de compra. Nota-se o vazio crescente, a falta de crítica, o pensamento cada vez mais fisiológico e imediatista. O pão está até mais farto e o circo mais frequente. Com o tempo, se não forem tomadas providências, a legislação começará a incorporar valores e princípios mais baratos e passageiros de uma transitoriedade e obsolência forçada, à mercê da necessidade de geração de tributos e de empresários eufóricos e empolgados. A Nação está sendo minada lentamente e se perde sua graça, ganha a secura o deserto.
Exigindo muita crítica filosófica, jamais se espere que a reação caiba ao cidadão comum, espezinhado pelo dia a dia. Ele só reclamará se os problemas afetarem seu bolso. Se estão lhe mexendo na cabeça e na de seus filhos, isto não importa de imediato. São os profissionais de todas as áreas e os advogados e toda a classe jurídica, a esperança de dar um norte ao progresso inevitável.
Novamente a luta é diária, petição por petição, processo por processo, uma luta no papel, para preservar e fazer a Nação democrática de ampla participação e cidadania, cumprindo o objetivo de construir uma sociedade livre, justa e solidária, erradicando a pobreza e a marginalização com a redução das desigualdades sociais e regionais e promovendo o bem estar de todos. Se valer a tendência do individualismo e do materialismo nada disso será alcançado. Seremos todos bonecos, bobos alegres ou talvez só bobos.
Sem liberdade de pensar e criar, nenhum país terá um futuro seguro, mas somente construções e estradas para um conjunto de cidadãos, na grande maioria vazios, insatisfeitos, violentos e totalmente alienados em seu individualismo, insensibilidade, mas com suas coisas ditas modernas.
Neste contexto, o advogado terá muitas causas como resultante da sociedade de conflitos e demandas, onde as pessoas não sabem mais conviver, só viver com seu egoísmo individualista. Poderá lucrar individualmente com isto, como os psicólogos, analistas e psiquiatras, mas estará feliz com seu país, seu povo e sua Nação? Nunca esteve. Por isso sempre esteve alerta e consciente e reagiu individual e coletivamente.
A OAB sintetiza a luta individual e muitas vezes anônima de todos os advogados ; é a resistência e sempre será. Se não for, cada advogado que seja e isto já é suficiente para fazer a OAB.
A essência da OAB não é feita só por seus voluntários dirigentes, seres abnegados de cada momento, mas por todos e cada advogado no escritório, na cidade, no Estado. Desta profissão nasce também a resistência para preservar a Nação em seu modo de ser. Ou resistimos para preservarmo-nos solidários, sensíveis às humanidades, aos princípios e valores da boa convivência humana ou continuaremos a ser transformados lentamente para sermos componentes de uma sociedade fria, calculista, racional e individual, portanto , meros robôs a serviço do consumo sem qualidade e sempre prontos para a ordem unida, prontos para a ordem do dia, prontos para seguir e fazer, mas não para pensar, criticar, criar e determinar nossos objetivos numa sociedade de ampla participação. Isto tudo num quartel civil, criado por nós mesmos.
por Odilon Reinhardt